segunda-feira, 1 de junho de 2009

Consenso de Washington

Consenso de Washington é um conjunto de medidas - que se compõe de dez regras básicas - formulado em novembro de 1989 por economistas de instituições financeiras baseadas em Washington, como o FMI, o Banco Mundial e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, fundamentadas num texto do economista John Williamson, do International Institute for Economy, e que se tornou a política oficial do Fundo Monetário Internacional em 1990, quando passou a ser "receitado" para promover o "ajustamento macroeconômico" dos países em desenvolvimento que passavam por dificuldades.
Segundo Dani Rodrik: "Enquanto as lições tiradas pelos proponentes (do Consenso de Washington) e dos céticos diferem, é legítimo dizer que ninguém mais acredita no Consenso de Washington. A questão agora não é saber se o Consenso de Washinton ainda vive; é saber-se o que deverá substituí-lo".

O termo "Consenso de Washington"
John Williamson criou a expressão "Consenso de Washington", em 1990, originalmente para significar: "o mínimo denominador comum de recomendações de políticas econômicas que estavam sendo cogitadas pelas instituições financeiras baseadas em Washington e que deveriam ser aplicadas nos países da América Latina, tais como eram suas economias em 1989." Desde então a expressão "Consenso de Washington" fugiu ao controle de seu criador e vem sendo usada para abrigar todo um elenco de medidas e para justificar políticas neoliberais, com as quais nem mesmo Williamson concorda:
"Claro que eu nunca tive a intenção que meu termo fosse usado para justificar liberalizações de contas de capital externo...monetarismo, supply side economics, ou minarquia (que tira do Estado a função de prover bem-estar social e distribuição de renda), que entendo serem a quintessência do pensamento neoliberal".

O Consenso de Washington na prática da política econômica mundial
Independentemente das intenções originais de seu criador, o termo "Consenso de Washington" foi usado ao redor do mundo para consolidar o receituário de caráter neoliberal - na onda mundial que teve sua origem no Chile de Pinochet, sob orientação dos Chicago Boys, que seria depois seguida por Thatcher, na Inglaterra (thatcherismo) e pela supply side economics de Ronald Reagan (reaganismo), nos Estados Unidos.
O FMI passou a recomendar a implementação dessas medidas nos países emergentes, durante a década de 90, como sendo uma fórmula infalível, destinada a acelerar seu desenvolvimento econômico.
De início essas idéias foram aceitas e adotadas por dezenas de países sem serem muito questionadas.
Só após a grave crise asiática, em 1997, da quase quebra da Rússia, que viu seu PIB cair 30%, da "quebra" da economia Argentina - que recebia notas A+ do FMI pelo zelo com que aplicava suas sugestões - e de vários outros desajustes econômicos ocorridos pelo mundo, o "Consenso" foi adaptado e, desde 2004, já revisto pelo próprio FMI, que abandonou o dogmatismo inicial.
A popularização dessas políticas econômicas criadas, foi muito facilitada pelo entusiasmo que gerou a queda do muro de Berlim e foi ajudada pela decadência do socialismo soviético, numa época em que parecia que os países que seguiam o planejamento central estavam fadados ao fracasso econômico e político.
«Estabilizar privatizar e liberalizar tornou-se o mantra de uma geração de tecnocratas que estavam tendo sua primeira experiência no mundo subdesenvolvido, e dos líderes políticos por eles aconselhados.

(Dani Rodrik, Professor de Política Econômica Internacional, Universidade de Harvard)
Muitos países subdesenvolvidos acabaram por implementar, em vários graus, componentes desse pacote econômico, com resultados muito debatidos. Críticos do Consenso de Washington alegam que o pacote levou à desestabilização econômica. Outros acusam o Consenso de Washington de ter produzido crises, como a da Argentina, e pelo aumento das desigualdades sociais na América Latina. Frequentemente os críticos do Consenso de Washington são associados por seus defensores - ou são acusados de serem associados - ao socialismo ou à antiglobalização. Mais recentemente essas críticas vêm sendo engrossadas por acadêmicos norteamericanos, como fez Dani Rodrik, Professor de Política Econômica Internacional na Universidade de Harvard, em seu trabalho Adeus Consenso de Washington, Olá Confusão de Washington ?

As dez regras básicas:
Disciplina fiscal
Redução dos gastos públicos
Reforma tributária
Juros de mercado
Câmbio de mercado
Abertura comercial
Investimento estrangeiro direto, com eliminação de restrições
Privatização das estatais
Desregulamentação (afrouxamento das leis econômicas e trabalhistas)
Direito à propriedade intelectual

Resultados
O entusiasmo despertado pelas reformas preconizadas pelo Consenso de Washigton foi tal em muitos países, inclusive no Brasil, que a lista de 10 recomendações do Williamson tornou-se humilde e inócua por comparação. A liberalização e abertura para os fluxos de capitais internacionais foi muito além daquilo que o próprio Williamson julgava adequado ( e prudente) de seu ponto de vista dos anos 80, em muitos países subdesenvolvidos. Apesar dos protestos de Williamson, sua agenda de reformas passou a ser percebida, ao menos por seus críticos, como um esforço ideológico destinado a impor o neoliberalismo, e o fundamentalismo de livre mercado, aos países emergentes.
Uma das coisas que é hoje mais ou menos consensual acerca dessas reformas é que as coisas não sairam como fora planejado. Mesmo os mais ardorosos defensores das políticas preconizadas então pelo Consenso de Washington concordam que o crescimento ficou muito abaixo do esperado na América Latina, e que o "período de transição" foi muito mais profundo e duradouro nas economias anteriormente socialistas do que fora imaginado.
A autocrítica desenvolvida no documento The World Bank’s Economic Growth in the 1990s: Learning from a Decade of Reform (2005), é altamente supreendente na medida em que nos mostra como nos distanciamos das idéias originais do Consenso de Washington. Gobind Nankani, vice presidente do Banco Mundial escreveu no seu prefácio: "(...)que não há um único conjunto universal de regras. temos que nos afastar de fórmulas pré-estabelecidas, e da procura por 'melhores práticas' ilusórias..." (p. xiii). A nova ênfase do Banco Mundial reside agora na necessidade da humildade, em políticas diversificadas, em reformas limitadas e seletivas, e na necessidade da experimentação. Segundo Dani Rodrik, por vezes seu leitor tem que ser relembrado de que não tem em suas mãos algum manifesto radical, mas sim um relatório oficial preparado na própria sede da ortodoxia econômica universal no campo do desenvolvimento. O relatório do Banco Mundial reconheceu que, em primeiro lugar, houve um colapso, prolongado e inesperado, na produção dos países em transição das economias anteriormente comunistas. Mais de uma década depois de iniciada a transição para os livremercados, muitos países anteriormente comunistas ainda não tinham recuperado seus níveis anteriores de produção. Em segundo lugar a África Sub-Sahariana não 'decolou', a despeito das reformas políticas e nas melhoras das políticas externas e do contínuo influxo de ajuda econômica. Os sucessos foram poucos - Uganda, Tanzania e Moçambique são os mais citados, mas uma década depois suas economias ainda permanecem frágeis. Em terceiro lugar houve recorrentes e dolorosas crises financeiras na América Latina, Leste Asiático e Turquia. A maioria dessas crises era imprevisível, até que o fluxo de capitais, em mercados liberados, reverteu-se subitamente. Em quarto lugar o crescimento da América Latina em termos per capita ficou muito abaixo do período 1950-80, apesar dos desmantelamento das políticas estatizantes, populistas e protecionistas dos antigos regimes da região. Finalmente a Argentina, a garotapropaganda das teses do Consenso de Washington, desabou em 2002.

A Malásia: uma "solução alternativa" aos programas do FMI ?
A Malásia se constitui num caso curioso, que pode servir de "experiência de laboratório" para as recomendações de política econômica receitadas pelo Consenso de Washington.
Isto porque a Malásia, quando da crise asiática, em 1997-98, sofreu uma forte crise cambial - com sua moeda, o ringgit, caindo de 2,50 para 4,20 por dólar - e fez exatamente o oposto do que recomenda o FMI nas mesmas circunstâncias, obtendo grande sucesso.
Nas crises de fugas de capitais, que se transformam em crises cambiais, o FMI recomenda a flutuação das taxas de câmbio; a Malásia fixou-as. O FMI sugere uma forte elevação dos juros; a Malásia reduziu-os. O FMI receita redução dos gastos públicos para reduzir a relação dívida/PIB. A Malásia aumentou os gastos públicos e impôs uma trajetória ascendente à sua relação dívida/PIB.
Tudo isso só pôde ser feito por que a Malásia neutralizou, com a adoção de rígidos controles, os possíveis impactos que a plena movimentação de capitais de curto prazo poderia ter causado à sua economia.
A recuperação malaia foi impressionante. Sua indústria cresceu 8,5% em 1999, ano em que seu PIB cresceu 5,4%e seu PIB continuou a crescer 7,8% em 2000 e 7% em 2001. A inflação, que em 1998 - antes da crise - fora de 5,3%, caiu para 2,8% em 2000 e 2,2% em 2001. A relação dívida/PIB, que era de 60% antes da crise, manteve-se em alta e hoje atinge um patamar superior a 70%.
Um estudo acadêmico bastante conhecido, elaborado por KAPLAN e RODRIK, constatou que a recuperação da Malásia, na crise 1997-98, foi mais rápida e menos custosa quando comparada à recuperação da Tailândia e a da Coréia, que seguiram à risca o receituário do FMI.